• 6 de Maio de 2025

Francisco passou por aqui

Francisco em Lampedusa, "sempre com especial atenção aos marginalizados do mundo ..." Francisco em Lampedusa, "sempre com especial atenção aos marginalizados do mundo ..." (ANSA)

Igreja

  • igreja católica
  • Papa Francisco
  • sede vacante
  • pobreza
  • meio ambiente
  • paz
  • clericalismo

Rui Saraiva – Portugal

Francisco passou por aqui. Pode muito bem ser o título que podemos usar para descrevermos a sensibilidade pastoral do Papa durante o seu pontificado. Com uma atitude generosa, impregnada de Evangelho e pronta para o serviço, Francisco deixou marca por onde passou.

A casa de Francisco nas periferias descartadas

Sempre com especial atenção aos marginalizados do mundo, tal como fazia em Buenos Aires. Na capital argentina, Bergoglio era visita regular nas “villas miséria” e as pessoas sabiam o seu nome e viam-no como um deles. Conhecia a realidade. E, por isso, quando esteve em Kangemi, um dos sete bairros de lata de Nairobi a capital do Quénia, na sua visita àquele país africano, afirmou estar ali como se estivesse “em casa”.

“Sinto-me em casa, partilhando este momento com irmãos e irmãs que têm um lugar preferencial na minha vida e nas minhas opções, não me envergonho de o dizer”, disse Francisco a 27 de novembro de 2015.

E o Santo Padre denunciou na ocasião, a riqueza concentrada em minorias, enquanto a maioria vive abandonada e descartada. “São as feridas provocadas pelas minorias que concentram o poder, a riqueza e perduram egoisticamente, enquanto a crescente maioria tem que refugiar-se em periferias abandonadas, poluídas e descartadas”, afirmou o Santo Padre.

A simplicidade dos gestos

O luto que vamos fazendo nestes dias pelo Papa Francisco leva-nos, sobretudo, a recordar aquilo que de mais humano e próximo nos tocou. Para além dos grandes propósitos pastorais e políticos estão a coerência do testemunho de vida cristã. Ou seja, para a história da Igreja ficam os documentos ricos e profundos que afirmam valores como a defesa da Criação e a fraternidade humana, em textos papais de grande relevo como “Laudato Si” e “Fratelli Tutti”, mas para a memória de cada um ficam os gestos e atitudes que expressavam o sentir do coração.

Com efeito, desde o primeiro momento que o ritmo acelerado do Papa Francisco foi uma marca do seu pontificado. Com um passo decidido e uma naturalidade desconcertante, o Santo Padre desde o primeiro momento deixou claras várias atitudes que não eram apenas um novo estilo ou formato, mas sinais reveladores do conteúdo fresco do Evangelho.

E, assim, inesperadamente, o Papa Francisco como que desceu na noite da sua eleição da varanda da Basílica de S. Pedro até junto do seu povo, ao qual se inclinou para receber a oração que pede a bênção de Deus. Um momento único, original e inovador que foi um primeiro grande sinal:

“E agora eu gostaria de dar a bênção, mas antes… antes peço-vos um favor: antes de o bispo abençoar o povo, peço-vos que rezeis ao Senhor para que Ele me abençoe: a oração do povo que pede a bênção para o seu bispo. Façamos em silêncio esta oração de vós por mim”, disse o Papa Francisco a 13 de março de 2013.

E assim começou a acelerar a dinâmica pastoral pontifícia logo ali: incluiu o povo no seu caminho, dando um registo de normalidade quotidiana ao pontificado. Começando a anular os resquícios principescos da sua função.

Um dos primeiros gestos foi saldar a conta que faltava pagar na Residencial Domus Paulus e aonde se dirigiu logo no dia a seguir à eleição. E os sapatos que usava Francisco já não eram papais vermelhos, mas pretos e… ortopédicos!

E, claro, depois veio a surpreendente decisão de não viver no Palácio Apostólico, mas na Casa de Santa Marta. Uma decisão que arrepiou os mais indefetíveis da formalidade vaticana e do seu regular funcionamento institucional.

A força das palavras

Foi também de palavras intensas, metáforas criativas e pequenas histórias que se fez o pontificado de Francisco. Umas mais fortes e programáticas como “dizer energicamente não a qualquer forma de clericalismo” ou “desmasculinizar a Igreja” e outras bem mais singelas como por exemplo as palavras com licença, obrigado e desculpa.

Estas últimas foram citadas pelo Papa Francisco a 13 de maio de 2015 numa catequese sobre a família. Palavras que, segundo o Santo Padre, podem até ter caído em desuso na sociedade, mas com as quais devemos ser “intransigentes” pois é necessário “educar para a gratidão”, afirmou. A propósito da palavra desculpa ficou para sempre esta expressão de Francisco para os casais: “nunca termineis o dia sem fazer a paz”.

Um outro exemplo são as palavras teto, terra e trabalho que foram sublinhadas pelo Papa Francisco durante o II Encontro Mundial dos Movimentos Populares a 9 de julho de 2015 na sua visita à Bolívia. Uma festa de etnias, cores, cantos, reencontros e, sobretudo, de reivindicações. Os temas do encontro eram três: teto, terra e trabalho, palavras que o Papa considerou direitos sagrados do ser humano e com especial significado para os “descartados” e os “excluídos”.

Recordamos aqui também, com especial destaque, algumas frases que orientaram o pontificado do Papa Francisco e que foram proferidas nos primeiros dias após a sua eleição:

“Quando caminhamos sem a Cruz, quando edificamos sem a Cruz e quando confessamos um Cristo sem Cruz, não somos discípulos do Senhor: somos mundanos, somos bispos, padres, cardeais, papa, mas não discípulos do Senhor”. (Missa Pro Ecclesia, 14 de março 2013).

“Não te esqueças dos pobres!'. E aquela palavra entrou aqui: os pobres, os pobres. Depois, imediatamente em relação aos pobres, pensei em Francisco de Assis. É o homem que nos dá este espírito de paz, o homem pobre... Ah, como gostaria de uma Igreja pobre e para os pobres.” (Audiência aos Jornalistas, 16 de março 2013).

“Ele, nunca se cansa de perdoar, mas nós, por vezes, cansamo-nos de pedir perdão. Nunca nos cansemos, nunca nos cansemos! Ele é o Pai amoroso que perdoa sempre, que tem um coração de misericórdia para todos nós.” (Angelus, 17 de março 2013).

“Nunca nos esqueçamos que o verdadeiro poder é o serviço e que também o Papa para exercer o poder deve entrar cada vez mais naquele serviço que tem o seu vértice luminoso na Cruz”. (Missa do Início Solene do pontificado, 19 de março 2013).

“E por favor, não deixeis que vos roubem a esperança! Não deixeis que roubem a esperança! Aquela que nos dá Jesus”. (Domingo de Ramos, 24 de março 2013).

“Isto eu vos peço: sede pastores com o odor das ovelhas, pastores no meio do próprio rebanho, e pescadores de homens”. (Missa Crismal, 28 de março 2013).

Neste contexto das palavras de Francisco, não podemos aqui esquecer a decisão relevante do Papa de passar a celebrar todos os dias para uma pequena assembleia na Capela da Casa de Santa Marta. Um gesto de proximidade pastoral e de comunicação que, no entanto, nem sempre foi bem entendido.

As palavras e os gestos de Francisco são memória da Igreja e passaram por aqui. Vão também passar pelo conclave que decidirá o novo Papa.

Laudetur Iesus Christus

Obrigado por ter lido este artigo. Se quiser se manter atualizado, assine a nossa newsletter clicando aqui e se inscreva no nosso canal do WhatsApp acessando aqui

Fonte: Vatican News

Relacionados

Login