• 3 de Outubro de 2024

Papa Francisco: a coragem do diálogo para vencer o ódio e a guerra

Papa Francisco em Assis, em 2016, para o Dia Mundial de Oração pela Paz Papa Francisco em Assis, em 2016, para o Dia Mundial de Oração pela Paz

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Papa Francisco

Este livro, “As palavras da paz”, testemunha o longo caminho que se desdobra desde o Encontro Inter-religioso pela Paz de Assis, realizado em 1986 por São João Paulo II, até os dias atuais. Por meio da coleta dos textos de Andrea Riccardi, proferidos no contexto desses encontros anuais, são percebidos os problemas do momento, as ameaças de guerra e as esperanças de paz. Também emergem as energias e esperanças suscitadas pelo diálogo entre as religiões e entre os fiéis. São esses sentimentos que sempre nos ajudam a não perder a esperança de que a paz seja possível.

A intuição de Papa Wojtyla, que convocou as religiões à Assis para orarem umas ao lado das outras, e não mais umas contra as outras, foi ousada. Ainda havia a Guerra Fria e os tempos pareciam ameaçadores. As religiões podiam representar, por um lado, recursos para a paz, mas, por outro, alimentar ou sacralizar os conflitos.

O evento de Assis surpreendeu o mundo por sua novidade. Quem viveu aquele 27 de outubro em Assis sabe que foi percebido, mesmo à distância, como um evento histórico pelo povo. No entanto, não faltaram polêmicas, como frequentemente acontece diante de eventos históricos. A questão era como continuar aquele caminho após o grande evento de Assis. João Paulo II disse ao final do encontro: “Não há paz sem uma vontade indomável de alcançá-la. A paz espera seus profetas” (João Paulo II, Assis, 27 de outubro de 1986).

Assis “não poderia e não deveria permanecer um evento isolado”, como eu mesmo disse, recebendo os líderes religiosos em Roma, ao final do Encontro Internacional pela Paz, em 30 de setembro de 2013: “Vocês continuaram esse caminho e ampliaram seu ímpeto, envolvendo no diálogo personalidades significativas de todas as religiões, além de figuras laicas e humanistas. Justamente nestes meses, sentimos que o mundo precisa do espírito que animou aquele encontro histórico. Por quê? Porque precisa muito de paz. Não! Nunca podemos nos resignar diante da dor de povos inteiros, reféns da guerra, da miséria e da exploração. O caminho de Assis, nos anos seguintes a 1986, foi um ato de confiança na oração e no diálogo pela paz”.

Este caminho reuniu personalidades de diferentes pontos de vista religiosos; peregrinou por lugares distintos do mundo. Primeiro, duas vezes em Roma, em Trastevere, depois em Varsóvia em 1989, quando o Muro estava prestes a cair, ou em Bucareste. Em 1998, abriu-se o caminho para a primeira viagem apostólica de um papa, João Paulo II, a um país ortodoxo. O “espírito de Assis” na prática do diálogo e da amizade formou homens e mulheres de paz provenientes de diferentes religiões, distantes ou hostis há séculos.

O caminho seguido “a cada ano nos sugere a direção: a coragem do diálogo”. Os líderes religiosos são chamados a serem verdadeiros “dialogantes”, a agirem na construção da paz, não como intermediários, mas como autênticos mediadores. Cada um de nós é chamado a ser um artesão da paz, unindo e não dividindo, extinguindo o ódio e não o conservando, abrindo os caminhos do diálogo e não erguendo novos muros!

Dialogar, nos encontrarmos para instaurar no mundo a cultura do diálogo, a cultura do encontro. Ao longo desse caminho, os mundos religiosos se aproximaram. Embora ainda persistam áreas e situações de fundamentalismo que preocupam, no século XXI ocorreu uma mudança profunda na relação entre os fiéis das diferentes religiões, que passaram a considerar o diálogo como decisivo.

Penso, em particular, no Documento sobre a fraternidade humana para a paz mundial e a convivência comum, que assinei com o Grande Imã de Al Azhar, Ahmad Al-Tayyeb, em 2019. No entanto, hoje precisamos de mais diálogo. Justamente neste momento, com tantos conflitos abertos e ameaças de guerra, percebemos que “o mundo sufoca sem diálogo” (Papa Francisco, 15 de junho de 2014).

Precisamos de um diálogo aberto, franco e constante. As religiões sabem que “diálogo e oração crescem ou enfraquecem juntos. A relação do homem com Deus é a escola e o alimento do diálogo com os homens” (Papa Francisco, 30 de setembro de 2013). Por isso, no caminho empreendido no espírito de Assis, com o impulso da Comunidade de Sant’Egidio, a oração sempre foi uma dimensão central. Cremos, de fato, na força humilde e mansa da oração.

Após 1989, o mundo se globalizou, unificando-se em muitos aspectos, como finanças, comércio, comunicações. No entanto, permaneceu profundamente dividido. A divisão foi alimentada por um espírito de desconfiança que fez não apenas conservar, mas aumentar os dispositivos militares. É a idolatria da força armada: a partir do desenvolvimento de armas nucleares, químicas e biológicas, e das enormes e crescentes possibilidades oferecidas pelas novas tecnologias, deu-se à guerra um poder destrutivo incontrolável. Na verdade, nunca a humanidade teve tanto poder sobre si mesma e nada garante que ela o usará bem (Fratelli Tutti). Escreve nestas páginas, com razão, Andrea Riccardi: “Estamos em um tempo em que muitos podem fazer a guerra, dispondo de terríveis armamentos”.

Mas não estamos paralisados pelo medo, embora preocupados. Não nos resignamos ao domínio da força e da opressão. Não renunciamos ao diálogo, permitindo que o espírito de ódio e de guerra invada os mundos religiosos e as almas dos fiéis. Não retrocedemos no caminho ecumênico e inter-religioso de tantos anos, como quer o espírito da divisão e do mal! “As religiões não podem ser usadas para a guerra. Apenas a paz é santa, e ninguém deve usar o nome de Deus para abençoar o terror e a violência”, eu disse ao participar de um desses encontros (Papa Francisco, Roma, 25 de outubro de 2022).

Esta é uma consciência adquirida no caminho de diálogo, amizade e oração: que a paz é santa e o nome de Deus não pode ser usado para combater ou aterrorizar! Tal consciência está difundida e enraizada no povo simples, nos fiéis que desejam a paz. Sua oração e a de todos que sofrem pela guerra sustentam o diálogo.

Assim, formados pela amizade de tantos anos, os fiéis e, em particular, os líderes e responsáveis religiosos, constituem “uma rede de paz que protege o mundo e, sobretudo, os mais fracos” (Papa Francisco, 30 de setembro de 2013). Este livro acompanha os momentos construtivos dessa rede. Por isso, repito o que disse, ao participar de um dos Encontros no espírito de Assis, promovido por Sant’Egidio, diante do Coliseu: “Se virem guerras ao nosso redor, não se resignem! Os povos desejam a paz!”.

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Fonte: Vatican News

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